Michael Mösch* “É uma característica da alma humana expandir-se, alastrar-se, desabrochar-se em todas as direções. A maneira de se desabrochar, a maneira como ela deseja alastrar o seu ser no cosmo tem como resultado a forma arquitetônica.” (Rudolf Steiner).
Historicamente, sempre existiu um relacionamento entre as artes plásticas e as fases do desenvolvimento da alma humana. Desse relacionamento, três momentos se destacam na História. Na Antiga Grécia, época da construção dos templos, deparamo-nos com um pensar imaginativo, um pensar mitológico. Uma observação de um fenômeno natural desencadeava imagens na alma. A matéria era vivenciada como uma ilusão; a imagem, resultado de uma observação, era vivenciada como uma realidade. A alma humana era repleta de imagens, sentia-se parte do mundo espiritual. Nessa época, foram construídos os templos gregos com proporções harmônicas, simplicidade geométrica e composições arquitetônicas exclusivamente ortogonais.
As paredes que os compõem  são paralelas, os ângulos sempre retos. As colunas enfileiradas são paralelas entre si. Dos espaços maiores para os menores, podemos observar uma composição de retângulos e quadrados. Eram obras ricas, não só quanto à sua arquitetura e proporções de elementos, mas também quanto aos detalhes esculturais e pinturas de afrescos. O povo, no entanto, não tinha acesso ao templo, era um espaço exclusivo para os sacerdotes que, dentro dele, colocavam-se em condição de fazer contato com o mundo espiritual. Este espaço de pureza arquitetônica quase cristalina fez desabrochar, incentivou e apoiou um processo na alma humana que levou o Homem a um pensar cada vez mais lógico.
Matéria substitui realidade; imagem é ilusão. É o primórdio da Lógica, da Filosofia e da Ciência com Platão e Aristóteles. O templo tinha a função de apoiar este processo de materialização no pensar, que desencadeou, mais tarde, o pensar intelectualizado e racional. A alma abriu-se para a realidade terrena e, com isto, separa-se de sua origem espiritual.
Passados muitos séculos, após o mistério do Gólgota em torno do ano 900 ao 1.200, vemo-nos frente à época da construção das grandes catedrais. Primeiro as catedrais romanas, posteriormente as catedrais góticas. A alma humana evoluiu no sentido de separação do mundo espiritual. A partir daqui ela se relaciona separadamente com os dois mundos. A natureza é o acesso ao mundo material e a religião é o vínculo com o mundo espiritual. Dá-se a necessidade de se construir a “Casa de Deus” – a catedral, e é especificamente dentro destes espaços que o povo evoca o mundo espiritual.
Quais as características arquitetônicas desta época? A planta baixa da catedral é de geometria ortogonal, com elementos em forma de círculos no espaço do altar. A nave da catedral, espaço para a permanência do povo, tem paredes paralelas, sendo marcantes as proporções no sentido vertical. Das dimensões de altura resulta a monumentalidade, propiciando a devoção ao mundo espiritual. A catedral marca a separação definitiva entre espírito e matéria. Dentro da catedral, a devoção; fora dela, o trabalho na terra, a matéria. O pensar conquista a ciência e torna-se cada vez mais intelectual.
O próximo passo nos leva à atualidade: o pensar humano conquistou a lógica e com ela o pensar racional, e materializado, com controle praticamente absoluto das ciências naturais, resultando na separação, cada vez mais evidente, dos conteúdos relacionados ao mundo espiritual. A religião hoje, com um significado superficial, tornou-se um resíduo de algo que teve seu ápice na época das construções das catedrais. Restringe-se, na maioria das situações, a um veículo que pode proporcionar saúde, alegria e riqueza. Sua devoção decaiu, limitando-se à busca de satisfações materiais.
Hoje, porém, uma pergunta se torna cada vez mais premente: como podemos conseguir acesso ao conteúdo que está por trás da matéria, da forma, da idéia, da vida, sem perder a conquista do pensar lógico e racional? O vínculo com o mundo espiritual não está perdido. Neste ponto é importante reconhecermos a grande conquista da alma humana no decorrer do tempo: o fortalecimento da individualidade. Quando na antiga Grécia, com o pensar mitológico, predominava algo que poderíamos chamar de consciência grupal, iniciava-se juntamente com a lógica no pensar, a consciência presente do ente único.
Na época da construção das catedrais, esta consciência individual já tinha sido conquistada, mas o ato religioso, na devoção ao mundo espiritual, acontecia na união das preces, com o povo unido na catedral. Hoje, estamos sós, somos indivíduos e cabe a cada um a própria decisão de como relacionar-se com o mundo espiritual. Uma decisão individual importa que deva ser tomada em liberdade. Esta fase, no desenvolvimento da alma humana, nos leva à construção do espaço em forma de trapézio, que teve sua realização inédita com o projeto de Rudolf Steiner para o segundo Goetheanum em Dornach. Na época da Antiga Grécia, a alma humana precisou de um espaço que fortalecesse as tendências abstratas e cristalizantes no pensar.
O Templo Grego despertou na alma o pensar lógico. A Catedral, por sua vez, foi um marco que identificou a separação do mundo espiritual, na religião, do mundo material, no pensar lógico e racional. O trapézio estabelece o limiar para o pensar vivo, para a consciência do ente individual, a consciência do eu. Aplicado como planta-baixa para uma forma de espaço, o trapézio pode ser considerado um marco na consagração do autoconhecimento, respeitando a liberdade da individualidade em questão. Esta é a função genuína da Arquitetura Antroposófica: proporcionar e incrementar à alma humana, que se encontra no auge da fase materialista, um novo despertar no mundo espiritual.