São Paulo - Nem os 2% mantidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva nem os 10% vetados por ele. Alguns edifícios de São Paulo prometem continuar cobrando 20% de multa pelo atraso na taxa de condomínio, contrariando até o novo Código Civil. Síndicos dizem que a multa baixa incentiva a inadimplência. Órgãos de defesa do consumidor discordam. A discussão deve parar na Justiça.
"Em 2003, quando a multa caiu para 2%, a inadimplência chegou a 30%. Hoje são só 5,57%, porque eu mantive 20% de correção", disse Affonso Celso Prazeres de Oliveira, síndico do Edifício Copan, no centro, que tem 1.160 apartamentos.
No Condomínio Porto Seguro, no Bairro do Limão, zona norte, a multa sempre foi de 20%. A administração garantiu ontem ao Estado que manterá o índice. O Porto Seguro, o Copan e outros que continuam cobrando 20% de multa alegam que já existiam antes do novo Código Civil, de janeiro de 2003, e, portanto, têm direito a utilizar a lei condominial. Anterior ao código, ela prevê que as taxas são definidas em assembléias de moradores.
"O próprio Código Civil permite essa interpretação de manter o que foi determinado na nossa convenção", alega Oliveira. Para ele, o veto não beneficia o consumidor, já que os moradores têm de ratear as dívidas do inadimplente. "Todos somos consumidores, não só quem atrasa. O que paga em dia é prejudicado."
"Muitos proprietários até preferem vender o apartamento para não arcar com a dívida do outro", afirmou a advogada Simone Elaine Dellape, da Administradora Base Line, que cuida de 50 prédios na capital. Simone admite que nas ações em que sua empresa está envolvida os juízes não dão ganho de causa integral aos administradores. Eles têm fixado correção de até 20% só para dívidas anteriores a 11 de janeiro de 2003, quando o código entrou em vigor. "As posteriores a essa data são corrigidas em 2%."
Segundo o presidente da Associação das Administradoras de Bens Imóveis e Condomínios (Aabic), Cláudio Anaute, a proposta original vetada por Lula era vantajosa, já que a multa era progressiva - de 0,33% ao dia, até o limite de 10% no mês. "O veto é absurdo, contrariou as expectativas do setor." Pela proposta rejeitada, se o morador atrasasse até seis dias pagaria 2% de multa. "Sem a mudança na lei, o condômino paga o mesmo se atrasar um dia ou um mês."
Idec - Para o advogado Marcos Diegues, do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), o veto foi bem-vindo. "O problema da inadimplência não está relacionado ao valor da multa. Ela não deve ser progressiva, mas aplicada uma vez só. Além disso, já existem os juros de mora, cobrados a cada mês de atraso e a correção monetária." O Procon disse que não se manifestaria sobre o assunto, por julgar que não se trata de uma relação de consumo.
O presidente da Comissão de Direito Imobiliário da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), Marcelo Manhães de Almeida, condenou a decisão do presidente. "A multa de 2% é um fator de estímulo à inadimplência." Segundo ele, as pessoas acabam preferindo quitar outras contas, como o cheque especial, que tem juros mais altos. "Os condomínios podem entrar na Justiça pelo direito de continuar a cobrar a multa de até 20%."
O deputado federal Ricardo Izar (PTB), relator do projeto modificado, garantiu que vai mobilizar seus colegas na Câmara para derrubar o veto presidencial. "Ele beneficia os maus pagadores", disse.
Marisa Folgato e Natália Zonta