EDSON VALENTE

Na hora de dar o golpe final na dívida de um financiamento, a primeira arma é sacar o saldo do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).
Mas muitos só descobrem no final que não podem usá-lo para amortizar ou quitar o que devem. "Na maioria dos casos, há empecilho legal que não foi percebido antes", avalia a advogada Mirelle Ottoni, 35.

A principal controvérsia é a do segundo saque: o comprador usa o FGTS para saldar uma parcela maior (como a das chaves) e não consegue sacar de novo para quitar ou amortizar o financiamento, mesmo com dois anos entre as duas operações, como manda a lei.

No primeiro saque, o comprador lavra escritura ou assina compromisso de compra e venda em cartório. "Depois, a Caixa Econômica Federal não libera o dinheiro. Diz que já há imóvel em seu nome", exemplifica Marcia Padulla, da Gouveia e Padulla Advogados.

Para o gerente do FGTS da CEF em São Paulo Gildásio Freitas Silveira, 45, a escritura não é obstáculo para o segundo saque, e sim o financiamento fora das regras do SFH (Sistema Financeiro da Habitação). "Não aceitamos que seja feito com a construtora", crava.

Advogados interpretam que o segundo saque é possível mesmo quando o financiamento é feito com bancos. Para obter o dinheiro, a alternativa mais eficaz é recorrer à Justiça, como fez a profissional de marketing Natalie Adler, 33. "Retiramos para as chaves, mas não conseguimos sacar para quitar a dívida. A CEF disse que já havia um imóvel em nosso nome."

Ela conta que, em 60 dias, conseguiu o dinheiro. No processo, sustentou que havia dívida e hipoteca e que o imóvel foi financiado nas regras do SFH.

O secretário da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil), Edwin Britto, 56, sugere que o mutuário seja claro ao declarar o objetivo da primeira retirada para obter as chaves. "Ele às vezes diz que vai quitar o imóvel, pois é o meio mais rápido de obter a liberação."

Regras pulverizadas

Outro fator que complica é que as regras são "pulverizadas", diz Marcel Cordeiro, 35, da Pompeu, Longo, Kignel e Cipullo Advogados. "É preciso vasculhar a legislação."

O gerente-geral da CEF Elimar Sousa Oliveira, 54, admite que há muitas regras e condições. "São específicas para cada caso." A legislação está no site da CEF.

O ideal é consultar o banco antes de financiar, para saber como poderá usar o FGTS. Linhas com mensalidades pré-fixadas só o aceitam para quitar parcelas, não o saldo devedor.

Para quitar uma obra, o banco permite o saque, mas exige financiamento. Foi o que ocorreu com um cliente de Paulo Roberto Teixeira da Silva, 36, da Albino Advogados Associados. "Interpreto como "venda casada": só liberam o que é seu se contratar o produto. Preocupado com a demora do Judiciário, ele se curvou à exigência."

Quem tiver terreno pode usar o FGTS para comprar um imóvel se provar que não há edificação no lote.