Ao contrário de bens móveis de consumo (como automóveis ou barcos) os imóveis costumam perdurar de uma geração para outra. Em razão disso, e do maior valor que costumam representar no patrimônio de qualquer indivíduo, é natural que se deseje conferir para estes garantias suplementares de segurança.

A transmissão de bens na família segue, via de regra, o caminho da doação ou sucessão. A primeira, formalizada em vida e a segunda, após o falecimento de seu titular. Alguns pais, receosos com o futuro de seus filhos, acabam impondo regras restritivas ao direito de alienação de seus sucessores.

Os motivos para esta decisão são os mais variados e formam uma lista infindável: filhos pródigos (que não tem controle sobre os próprios gastos), garantia de renda com alugueis, preservação forçada de um patrimônio imobiliário etc.

Existe até quem, não para garantir, mas sim para penalizar, acaba impondo restrições ao patrimônio familiar. Esta colocação pode parecer estranha, mas bem se sabe que as relações e conflitos familiares são sempre um tema complexo.

Pais que não se relacionam bem com seus filhos ou que divergem na forma de condução dos negócios comuns acabam desejando impor uma situação que, mesmo com seu falecimento, não se altere.

Esta limitação forçada encontra-se disposta na cláusula de inalienabilidade, ou seja, o mecanismo legal pelo qual se impõe ao beneficiário da doação ou da herança (via testamento) a impossibilidade de venda de determinado bem (por disposição do novo Código Civil, a cláusula não poderá atingir todo o patrimônio a ser recebido em doação).

Real necessidade

A imposição desta cláusula exige do titular do bem imóvel uma análise criteriosa de sua real necessidade. Porque, às vezes, para administrar um problema momentâneo, criamos, erroneamente, uma situação vitalícia de desconforto.

A experiência profissional demonstra que a cláusula de inalienabilidade é uma ferramenta jurídica que deve ser considerada em muitos casos e repudiada em outros.

Tomemos alguns exemplos. Se em uma família um dos filhos é pródigo, ou seja, não consegue conter e controlar seus gastos pessoais, estando constantemente com problemas financeiros, é eminente o risco de dilapidação do patrimônio (conforme a extensão do problema, será cabível uma tutela específica de interdição judicial).

Para estes casos, a cláusula da inalienabilidade é recomendável e deverá ser vitalícia para que se garante a esta pessoa a impossibilidade de dilapidar o patrimônio.

Existem situações específicas, todavia, que recomendam a cláusula de inalienabilidade temporária e estas se tornam mais comuns em testamentos.

Para se evitar decisões precipitadas, conferindo aos herdeiros um tempo maior para se adequar a uma nova situação, alguns pais deixam consignado em seus testamentos a inalienabilidade por um período ou até um evento determinado.

Assim, estipulam que os bens imóveis não poderão ser alienados até cinco anos após seu falecimento ou até se configurar determinada situação (matrimônio, conclusão de uma faculdade, uma data fixa pré-determinada). Esta é uma solução intermediária e, com certeza, mais recomendável na maior parte das vezes.

Sucessão

É importante ressaltar que a cláusula de inalienabilidade pode ser imposta apenas para o beneficiário direto da doação ou o herdeiro da sucessão, mas jamais atingirá a geração seguinte. Podemos instituí-la diretamente para nossos filhos, mas não podemos mantê-la para os netos.

As cláusulas podem ser vitalícias, mas as situações de vida são sempre mutáveis. E, como tal, um bem imóvel que receber a cláusula de inalienabilidade não poderá socorrer uma situação futura de necessidade econômica que, quando de sua imposição, era impensável.

Por vezes, o problema sequer é familiar, mas de mercado imobiliário. Terrenos que antigamente eram muito bem localizados tornaram-se no decorrer dos anos áreas deterioradas. Os que podiam ser vendidos ainda foram salvos, mas aqueles que receberam a cláusula restritiva ficaram vencidos pelo tempo.

Inversamente, terrenos que nada valiam e sofreram enorme valorização pela especulação imobiliária perdem a chance de um ótimo negócio se a incorporadora verificar a impossibilidade de negociação.

Nestes casos a solução emergencial também é ofertada pela nossa legislação ao permitir a sub-rogação de vínculos, procedimento pelo qual a restrição da inalienabilidade é transferida do imóvel original para outro de mesmo valor.

Embora possível, é certo que o procedimento exige uma perícia judicial, custas processuais e um trâmite forense que pode levar a perda de um bom negócio. Além disto, é importante se destacar que ao pretender a sub-rogação supõe-se obrigatoriamente que exista outro bem, no mínimo, de mesmo valor. Na falta deste o pedido judicial ficará prejudicado.

Assim, temos a cláusula de inalienabilidade como um instrumento auxiliar, mas nunca uma medida solitária. Disposta no contexto das reais necessidades da família, poderá auxiliar na composição de conflitos patrimoniais e familiares.

Disposta sem regramento ou de forma aleatória será, contrariamente, a causadora de problemas que até então seriam inexistentes.