Nicola Tornatore
O mercado imobiliário está enfrentando um grande dilema - com o desemprego em alta e a renda dos trabalhadores em queda, a apresentação de garantias para a locação de um imóvel vem se tornando um grande obstáculo para o setor. Duas das garantias mais tradicionais - o fiador e a caução - estão em desuso. Aos poucos, o seguro-fiança e o titulo de capitalização vem ganhado mais adeptos, mas não são todos os candidatos a locatário com condições de bancar essas garantias.
“A figura do fiador está em extinção. Ninguém mais quer ser fiador. É preciso que se crie urgentemente algo que substitua o fiador”, conclama José Luis Bissoli, proprietário da Imobiliária Santos Dumont, de Ribeirão Preto. Segundo ele, as dificuldades para a apresentação de um fiador com as condições exigidas pela imobiliária impedem a concretização da maioria dos negócios. “Semana passada analisei nove documentações e só aprovei duas”, relata Bissoli. O instrumento da caução já não é aceito na imobiliária. “A caução é de três vezes o valor do aluguel, enquanto uma ação de despejo leva até um ano. Se o locatário deixar de pagar, é prejuízo na certa”, explica.
A Sociedade União dos Proprietários de Ribeirão é outra imobiliária que não trabalha mais com caução. “Não vale a pena. Se a ação de despejo por falta de pagamento demorar mais de quatro meses, a caução já não cobre”, destaca o diretor Silvio Marques dos Santos. Segundo ele, uma “válvula de escape” para as dificuldades dos locatários em apresentar um fiador tem sido o título de capitalização. “Seu uso está sendo cada vez mais freqüente.
O locatário compra um título, no valor de seis a oito vezes o aluguel, fica com o recibo e nós, com o título. Ao final do contrato, ele resgata o valor com juros e correção monetária”, explica.
Para fazer frente às dificuldades na apresentação de garantias, as imobiliárias estão abrandando algumas exigências históricas. “Antes não aceitávamos fiador com imóvel fora de Ribeirão. Hoje já aceitamos quem comprove a propriedade de imóveis até uns 200 km ou 300 km de Ribeirão”, destaca Santos. Na comprovação de renda do locatário, a tolerância também tem sido maior.
“É preciso jogo de cintura, analisamos caso a caso, verificamos os bens. Só não abrimos mão da consulta aos Serasa e SPC, a não ser que a pessoa comprove que negociou e está pagando a dívida de forma parcelada”, explica.
A Sonia & Denise Imóveis, também da cidade, é outra imobiliária que também abrandou a exigência de fiador com escritura de imóvel localizado em Ribeirão Preto. “Trabalhamos muito com estudantes da USP, que vêm de outras cidades. Nesses casos aceitamos que o pai de um aluno figure como inquilino e que outro pai se apresente como fiador, desde que comprove possuir imóvel em sua cidade de origem”, explica Denise Zaratin.
Como trabalha principalmente com apartamentos na faixa de R$ 300 e R$ 350, ela não tem dificuldades na questão da comprovação de renda. Além da fiança locatícia tradicional, a imobiliária possui inquilinos que pagaram seguro-fiança. “Mas não abrimos mão da consulta aos serviços de crédito, caso contrário é dor de cabeça na certa”, completa.
De “luvas” à bonificação
“O mercado tenta se adequar à realidade, já que depende dela, e por isso as coisas mudam tanto. No passado, eram comum as luvas - pela expectativa de faturamento e localização privilegiada, você pagava luvas pelo ponto”, conta Antonio Vicente Golfeto, professor de Economia e colaborador de A CIDADE.
“A figura das ‘luvas’ hoje é bem mais rara que no passado. Mais recentemente, frente às dificuldades em encontrar inquilinos, os donos de imóveis passaram a oferecer uma bonificação, normalmente de dois meses de locação gratuita”, explica. “E há pouco tempo algumas imobiliárias em bairros da periferia passaram a aceitar fiador de renda, em vez do fiador tradicional, que comprova a propriedade de um imóvel”, informa Golfeto.
“Existe uma lei não escrita na Economia - um bem vale pelo que rende. Se não rende nada, nada vale. E quando um imóvel vazio ainda dá prejuízo, como os condomínios que têm de ser pagos independente de estarem locados ou não? Por isso a maior tolerância, o abrandamento das exigências pelo mercado imobiliário”, comenta Golfeto.
Segundo a ACIRP (Associação Comercial e Industrial), Ribeirão Preto tem cerca de 1.700 imóveis comerciais e outros 4.500 residenciais desocupados.