Por fora, bela viola; por dentro, pão bolorento. Um terreno "doente" pode contaminar quem mora em um imóvel construído sobre ele, e nem sempre as incorporadoras revelam seu passado poluído.
Substâncias como metano -gás explosivo- e metais, acumuladas ao longo de anos, podem culminar em explosões, intoxicações ou mesmo câncer.
"Mas uma área devidamente remediada é perfeitamente habitável", ressalva o diretor do Centro de Vigilância Sanitária, Luis Sérgio Valentim.
O pesquisador do Laboratório de Resíduos e Áreas Contaminadas do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo) Cláudio Leite faz coro: "Praticamente 100% das áreas contaminadas podem se tornar habitáveis". A ressalva é o uso da água subterrânea em alguns casos.
Mas, para o conselheiro do Sinduscon-SP (sindicato das construtoras) André Aranha Campos, a divulgação de que o lote que sedia um imóvel tem um histórico de contaminação prejudica os negócios: "O empreendimento se desvaloriza".
O dilema é que não é fácil nem barato apagar o passado oculto no solo. Antes de tratar o terreno, é preciso diagnosticar se ele está contaminado. A investigação pode pedir análises em laboratórios do exterior e custa, em média, R$ 50 mil --mas não há um sistema organizado que a obrigue.
O tratamento de fato, cujo projeto deve ser aprovado e acompanhado pela Cetesb, custa a partir de R$ 60 mil.
Com defeitoAs despesas devem ser pagas por quem poluiu o terreno, com base na lei de proteção ao consumidor. Não há legislação específica sobre áreas contaminadas no Estado -um projeto de lei está na Assembléia Legislativa desde junho de 2005. "Se o comprador não foi informado da contaminação, ele comprou um produto com defeito", crava a promotora de Justiça Nathalie Malveiro.
Cabe ao adquirente exigir do vendedor a devolução do valor pago ou a sua adequação. "Quando a contaminação for registrada na matrícula, a checagem será obrigação do comprador", alerta Malveiro.
Os lotes contaminados da cidade concentram-se em bairros que estão em alta na preferência dos incorporadores. Na Mooca (zona leste), os terrenos que sediaram galpões industriais "são ideais para unidades de 150 m2 e condomínios com estrutura de clube, o apelo atual do mercado", define o corretor Maled Fakhouri.
Um lote de 100 mil m2 da Esso, que foi base de distribuição de combustíveis no bairro, está em fase final de tratamento. Luiz Bruno, gerente ambiental da empresa, diz que "a descontaminação segue o critério mais rigoroso, que prepara a área para uso residencial".
da Folha de S.Paulo
11/9/2006