Sabe a Lei do Silêncio, que o carioca costuma evocar para reclamar do barulho do vizinho? Na prática, ela não é aplicada dentro dos condomínios, como mostra reportagem de Flávia Monteiro, publicada no Morar Bem deste domingo. É que não há quem meça o que ela estabelece: ou seja, respeito ao limite de 85 decibéis, das 22h às 7h - um ruído que, aliás, equivale ao burburinho ensurdecedor do trânsito na esquina da Nossa Senhora de Copacabana com a Figueiredo Magalhães, às seis horas da tarde. Isto porque, a polícia, se chamada, não dispõe de decibelímetros. Quem tem o aparelho são os técnicos da Secretaria municipal do Meio Ambiente, que, por sua vez, não fiscalizam condomínios.
A atuação do pessoal da secretaria se restringe a estabelecimentos comerciais, sinaleiras e templos religiosos, entre outros. E segue a lei 3.268, que impõe o limite de 55 decibéis para o dia. À noite, ele cai para 50 decibéis, o correspondente a uma reclamação muito comum em condomínios - o toc-toc de sapatos de salto.
Então, quem pode resolver a questão? O bom senso, ou seja, o acordo entre as partes. Na falta dele, o Código Civil, a ser usado pelo próprio condomínio ou, em última instância, pela Justiça. Ainda que não fale em decibéis, o código prevê punição para quem perturba o sossego alheio. Mas é preciso que assim determine a convenção.
“O Código Civil estabelece multa de até cinco vezes o valor do condomínio para aquele morador que prejudicar o sossego, a salubridade e a segurança dos demais”, diz Solange Santos, do departamento jurídico do Secovi Rio.
A questão é que os condomínios antigos (anteriores ao novo código) não prevêem punição para quem faz barulho. Dessa forma, será preciso contar com a boa vontade do síndico. Ele deverá convocar uma assembleia para discutir o assunto. E é preciso que haja um quorum mínimo de dois terços dos condôminos.
Para o advogado Armando Miceli, especialistas em direitos imobiliários, a recomendação é simples e vale tanto para quem faz barulho quanto para quem sofre com ele: a solução está no bom senso.
A legislação é fraca. A Lei do Silêncio que é estadual, é antiga, de 1977, e não há legislação municipal que regule a questão dentro dos condomínios. No caso de faltar bom senso, pode-se recorrer à Justiça, mas este deve ser o último recurso. Há casos em que o advogado vira um instrumento de vingança.
Segundo o Secovi Rio, o barulho é o principal problema nos condomínios. Supera até queixas sobre garagem e animais. No caso, dizem especialistas, a dica é tentar um acordo interno. Quando a perturbação vem de bares ou restaurantes vizinhos, campeões de audiência da secretaria de Meio Ambiente, vale recorrer ao Disque-Barulho, que recebe denúncias sobre poluição sonora.
Revestimento acústico indicado para área de lazer - Quando a barulheira é proveniente das áreas comuns do condomínio, a dica é orientar os moradores, inclusive crianças, sobre as regras a serem seguidas, opina a gerente operacional da administradora Protel, Cristiane Salles: “Em relação ao playground, os responsáveis e babás devem estar atentos aos horários de funcionamento. Uma dica importante é ter um revestimento acústico no interior de espaços como salões de jogos, brinquedoteca, garage band e lan house.”
Advertência é o primeiro passo - Em terceiro no ranking das reclamações recebidas pelo Disque-Barulho, as sinaleiras de garagem são outro tormento para os moradores. Nesses casos, a Secretaria municipal de Meio Ambiente envia um ofício ao síndico, alertando-o sobre a legislação em vigor - e essa medida basta para resolver 90% das queixas.
“Com bares e restaurantes, os campeões de reclamações, a questão é diferente: aí, só a multa costuma resolver.- O processo começa com a advertência. Depois, multas que variam entre R$ 200 e R$ 2 mil, seguidas por interdições pial ou total e apreensão do equipamento, chegando até à cassação do alvará do estabelecimento”, explica o arquiteto e fiscal da secretaria, Carlos Henrique Moyna. O Disque-Barulho recebe denúncias pelo telefone 2976-2979, de segunda a sexta-feira, das 9h às 17h.
O Globo - 09/09/10