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Demolição da 1ª Matriz completa 100 anos.
Nicola Tornatore |
Este ano faz um século que Ribeirão Preto deu adeus à sua primeira Igreja Matriz. Fotos da época mostram que a Matriz estava localizada no trecho da Praça XV entre a fonte luminosa e o monumento aos Heróis de 32. Ela foi a primeira Igreja de Ribeirão Preto – antes, existiram capelas rústicas, como a erguida pelos pioneiros moradores da “villa” em 1852, num rancho que ficava nas imediações da atual Praça Barão do Rio Branco (sede da Prefeitura), ou a que existiu entre 1845 e 1853 e onde hoje se constrói a Igreja Matriz de Santa Rita das Palmeiras, na estrada das Palmeiras. Essas capelas, porém, não contavam com a “benção” oficial da Igreja Católica – eram obra da religiosidade do povo. Foi só em 1863, sete anos após a doação de terras para o patrimônio de São Sebastião (1856) que daria origem à cidade, que a Igreja escolheu o local onde seria erguida a primeira Igreja – em linha reta a paralela ao córrego do Retiro, a cerca de 200 metros de distância da “capellinha” que o povo erguera em 1852. Localizada na atual Praça XV (antes, Largo da Matriz), a primeira Igreja foi construída entre 1866 e 1869. Uma breve descrição da Ribeirão Preto daquele final de século, publicada em A Cidade no início dos anos 20: “Nessa epoca, longinqua portanto, (trinta annos!), Ribeirão Preto era isto: um largo enorme, de altos e baixos, todo elle um vasto capinzal; uma egreja tosca, semelhante a todas as egrejas que Watch Rodrigues encontrou pelo Brasil, estylo colonial decadente: duas duzias de ruas esburacadas, poeira ou lama, conforme a estação; um pantano margeando o corrego”. Com o passar do tempo, a construção começou a fraquejar – as torres caíram e o acelerado crescimento populacional fez daquela pequena igreja um palco desproporcional para as necessidades da população. Em 3 de maio de 1904, com projeto do italiano Emilio Fagnani, é lançada a pedra fundamental da nova Igreja Matriz, na então Praça 13 de Maio (hoje Praça das Bandeiras). A construção vai se estender até 1920. E em 1905, portanto há cem anos, a velha matriz é demolida. Relato No livro “O Município e a Cidade de Ribeirão Preto”, comemorativo do centenário da Proclamação da Independência, escrito em 1922 pelo então prefeito João Rodrigues Guião, há um relato sobre a última missa celebrada na primeira Matriz. O texto, porém, comete um pequeno equívoco em relação ao ano, ao afirmar que em 2 de Junho de 1904 foi iniciada a demolição da Matriz de Ribeirão Preto, após missa celebrada por Monsenhor Joaquim Antonio da Siqueira. “A população catholica afluio á velha capella para assistir á ultima solemnidade da missa ahi celebrada por Monsenhor Siqueira pouco antes de se dar inicio a sua demolição. Foi emocionante a ceremonia. Aí se entrelaçavam os sentimentos religiosos com as suaves recordações do passado, naquella antiga capella, onde haviam sido baptisados tantos entre os que ali se achavam, onde os laços sagrados do matrimonio haviam ligado inummeros casaes e onde se tinham celebrado saudosas festividades religiosas em meio da harmoniosa afflurencia do povo”. Na realidade, a última missa ocorreu em 2 de junho de 1905, como noticia A Cidade na edição de 03/06/1905: “Pelo Rev. Connego Joaquim de Siqueira, vigario desta cidade, foi, hontem, resada a derradeira missa na nossa Velha matriz. Dizemos derradeira por que, como sabe o publico, começou, hontem, os trabalhos de remoção das imagens, moveis e utensilios alli exitentes, findos os quaes terá inicio a demolição do antigo templo, cuja tradicção já agora arrostará as acção de longos annos. A cerimônia foi tocante, tendo arrancado lagrimas de alguns fieis que a assistiam. Durante todo o dia de hontem foi grande a romaria de catholicos áquella igreja”. As obras de demolição duraram menos de 20 dias. Na edição de 22 de junho, A Cidade trouxe a notícia: “Ruiu, hontem, sob a acção civilisadora da picareta, a ultima parede do velho templo desta cidade. Restam apenas de pé os grossos esteios de arueira, que, por fim, cederão espaço ao verdejante parque que avança e assoberba a vasta Praça 15 de Novembro”. Na edição de 22 de junho A Cidade informa quem realizou o serviço de demolição e quanto este custou aos cofres públicos: “Pela Prefeitura foi paga ante-hontem ao Dr. Alcebíades Uchoa, da commissão de construcção da Nova Matriz, a quantia de 1.200$000, preço dos serviços de demolição da velha matriz efectuada pelo sr. José Durante”. A Câmara Municipal pagou outros 50:000$000 (cinqüenta contos de réis) à comissão encarregada da construção da nova Matriz, como indenização pelo terreno da velha Igreja, que foi incorporado à praça XV. Demolida a velha Igreja, foi improvisada uma Matriz, já que as obras da nova prosseguiam num ritmo dos mais lentos. Em 1º de setembro A Cidade noticia: “A tres do corrente será inaugurada a Matriz provisoria no predio que para esse fim foi reformado e que fica na rua Alvares Cabral, entre as ruas S. Sebastião e General Osorio, as cerimonias da bençam serão feitas no sabbado, as 6 horas da tarde, havendo então uma pequena allocução do nosso vigario, revm. Conego Joaquim de Siqueira, ladainha e Teledeum em acção de graças; e no Domingo 3 de Setembro todos os cultos religiosos obedecerão ao regulamento parochial, havendo, como de costume, missas ás 8 e ás 11 horas, sendo esta com explicação do Evangelho, e bençam ás 6 horas da tarde”. Demolida a velha Matriz e inaugurada a provisória, seguem-se anos de esforços pela construção da nova Matriz, anda hoje a Matriz de São Sebastião do Ribeirão Preto. A história desse esforço de quase duas décadas pode ser acompanhada, em sua totalidade, pelas páginas de A Cidade, jornal fundado por um devotado católico (Dr. Enéas Ferreira da Silva) e que, apesar do respeito aos demais credos, sempre manifestou apoio integral aos ditames da Igreja Católica. Ainda antes da inauguração da Matriz provisória, o jornal já conclamava, como em 4 de agosto: “Estando-se prosseguindo as obras da Matriz Nova pede-se às dignas pessoas que assignaram na subscrição em favor das mesmas obras a bondade de remetterem as suas prestações para deste modo não interromper-se os trabalhos”. Nos anos seguintes são incontáveis os eventos em prol das obras da nova Matriz – cada festa religiosa era oportunidade para a realização de “kermesses” e de leilões beneficentes. Ao longo de todo o segundo semestre de 1905 A Cidade trouxe, quase que diariamente, a relação de pessoas que haviam colaborado doando prendas. Em 1º de novembro, por exemplo, a relação de doadores incluiu “João T. Frota, uma garrafa de genuino vinho de caju, do Ceará; Cap. Antonio Alves da Costa Ferreira, proprietario da Casa Joaquim Alves, um par de jarras de biscuit, para toilette; e Paulo Enéas, filho do Dr. Enéas da Silva, uma caixa de fino papel phantasia para cartas”. Missas na nova Matriz começam em 1907 Iniciadas em 1904, as obras da nova Matriz vão terminar apenas em 1922. Erguidas as primeiras paredes, instalado a cobertura e ladrilhado o chão, as cerimônias religiosas passam a ter a Matriz em obras por palco já em 1907. Boa parte dos custos foram bancados pelos fiéis católicos, seja por meio de carnês (prestações), pela participação em leilões, tômbolas (espécie de loteria para fins beneficentes, com prêmios em objetos) e outras atividades. Dois nomes se destacam na construção da Catedral. O primeiro é do arquiteto de origem italiana Emilio Fagnani, autor do projeto. Nascido em 1870, em Pescopennataro, Emilio veio para o Brasil em 1887, aos 17 anos. Em 1895, aos 25 anos, casou-se com Maria Luiza de Carvalho Sales, de São Carlos – mas o jovem italiano já morava em Ribeirão Preto (rua da Liberdade, 7). No registro de casamento Emílio é identificado como arquiteto. Como construtor, Emilio Fagnani foi responsável pelo projeto da Catedral Metropolitana de São Sebastião do Ribeirão Preto, cuja pedra fundamental foi lançada em 3 de março de 1904 (seria concluída somente em 1920) e por inúmeras outras obras. Foi Emílio o empreiteiro das obras de pavimentação das ruas da cidade, que a Câmara contratou junto a Flávio de Mendonça Uchôa, por exemplo. A morte alcançou Emílio Fagnani ainda moço. Ele tinha 36 anos em 6 de julho de 1906, quando foi a cavalo até a fazenda “Boa Vista”, do coronel Francisco Schmidt, estudar a possibilidade de captação de águas numa nascente lá existente – o objetivo era aumentar a oferta de água pela Empreza de Água e Exgottos de Ribeirão Preto, da qual Flávio Uchoa era diretor. Na volta, sofreu uma queda fatal do cavalo, morrendo por causa de um traumatismo abdominal. O segundo é o do pintor Bendicto Calixto de Jesus. Nascido em 1853 em Itanhaém, autodidata, aperfeiçoou seu talento na Europa, em 1883/1884. Entre 1901 e 1904, Calixto, professor no Seminário Episcopal de São Paulo, teve como aluno dom Alberto José Gonçalves, primeiro arcebispo de Ribeirão Preto. Em 1912, dom Alberto faz a Calixto uma grande encomenda – pinturas nas paredes e telas retratando a vida de São Sebastião, o padroeiro da cidade. O artista gasta seis anos (1916 a 1922) para completar o trabalho. Calixto chegava de trem para trabalhar na Catedral, nas pinturas das paredes. Ficava hospedado na residência de dom Alberto. Já as telas da vida de São Sebastião chegaram uma de cada vez, de trem, vindas de Santos, do ateliê do autor. Telas retratam o martírio de São Sebastião Telas de Benedicto Calixto na Catedral de Ribeirão Preto e suas respectivas representações: O momento da restituição da fala à neófita Zoé; O momento em que o Pontífice consagra o soldado Sebastião como o Defensor da Igreja de Cristo; O momento em que Sebastião toma parte da celebração da Eucaristia sobre o corpo de um mártir na Catacumba; O momento em que o soldado Sebastião é acusado como cristão e para tanto teve de passar por interrogatório pelo imperador Diocleciano; O momento em que o soldado Sebastião sofre o primeiro martírio, sendo flechado pelos soldados; o momento em que está sendo libertado do primeiro martírio; Sebastião é condenado pelo Imperador Diocleciano; São Sebastião recebe o martírio até falecer. |