Nicola Tornatore
O Comur (Conselho Municipal de Urbanismo) inicia hoje a avaliação de um projeto de lei elaborado pela Secretaria Municipal do Planejamento de Ribeirão Preto e que tem tudo para gerar intensa polêmica. O documento “estabelece diretrizes e mecanismos para intervenções no entorno do Parque Curupira, e dá outras providências”. Na prática, a proposta formatada pela Secretaria Municipal do Planejamento da Prefeitura reduz as restrições atualmente em vigor para edificações na área do entorno do Curupira. A Associação dos Moradores da Ribeirânia denuncia que o projeto irá legalizar uma escola clandestina, construída num terreno na divisa do bairro, em desacordo com a atual legislação e alvo de embargo judicial (leia nesta página).
Em entrevista, o secretário de Planejamento e Gestão Ambiental, João Theodoro Feres Sobrinho, defende a proposta, alegando que ela é bem mais abrangente que a lei complementar nº 1272/2001, do ex-prefeito Antonio Palocci, que trata do mesmo assunto - a preservação do entorno do Curupira. “O documento não tem caráter de projeto de lei, é apenas um estudo inicial encaminhado para análise da sociedade. O entorno precisa ter restrições, ser preservado, mas a Prefeitura também tem responsabilidade com o desenvolvimento urbano daquela região”, diz. Segundo o secretário, a lei de 2001 “está voltada apenas à questão ambiental e estipula níveis de restrição que impedem o desenvolvimento do entorno”. Segundo ele, muitos projetos que estavam em andamento foram interrompidos quando da entrada em vigor da lei. “Estamos buscando um equilíbrio entre a necessária preservação ambiental e o também necessário desenvolvimento urbano”.
O secretário nega veementemente que a proposta foi gestada “sob encomenda” para legalizar uma escola clandestina em fase final de construção num terreno na divisa da Ribeirânia, onde a lei de 2001 não permite esse tipo de edificação. “Não podemos ficar reféns de uma situação pontual e deixar de fomentar o desenvolvimento em todo o entorno por causa de uma escola clandestina”. Feres Sobrinho confirma, porém, que a proposta autoriza, na faixa onde se localiza a obra clandestina, imóveis “de uso institucional”, como creches e escolas públicas e privadas. “Não estamos apresentando o projeto como um ‘prato-pronto’, uma imposição. Ele poderá ser alterado no Comur ou depois na Câmara Municipal”, comenta. Segundo ele, o prefeito “pediu estudos” sobre o tema, mas não conhece a proposta enviada ao Comur. “A idéia é encaminhar ao prefeito uma proposta que já tenha o aval do conselho”, diz.
Entidade entrega ofício a Maggioni
Na última quarta-feira foi realizada uma reunião do “Governo no Bairro”, abrangendo a região da Ribeirânia. Ademar Birches Lopes, da Amor (Associação dos Moradores da Ribeirânia), esteve no encontro e entregou ao prefeito Gilberto Maggioni um ofício denunciando a tentativa de amenizar as restrições para edificações no entorno do Curupira e legalizar a obra clandestina. “Para meu espanto o prefeito disse que nunca tinha visto o projeto e que não conhecia seu teor”, conta Lopes.
Denúncia: projeto de lei “sob encomenda”?
O Presidente da Amor (Associação dos Moradores da Ribeirânia), Ivens Telles Alves, sustenta que o projeto de lei em análise no Comur foi elaborado “sob encomenda” para legalizar uma obra irregular existente no entorno do parque Curupira. “O que está acontecendo é uma vergonha. Primeiro um vereador tentou liberar edificações no entorno, teve seu projeto recusado na Câmara e reagiu afirmando que ‘vereadores vendiam até a alma a empreiteiros’, o que deu toda aquela polêmica ainda hoje investigada pelo Ministério Público. Agora é a própria Prefeitura que prepara um projeto de lei amenizando as restrições da lei nº 1272/2001. Ou seja, é o prefeito Maggioni desfazendo algo de bom deixado pelo ex-prefeito Palocci”, diz Alves.
Segundo ele, a lei 1272 estabelece uma faixa de 30 m paralela à divisa da Ribeirânia, nos fundos dos imóveis do lado ímpar da rua Argeu Fuliotto, onde só podem existir imóveis de uso residencial ou prestação de serviços de profissionais autônomo. “Apesar dessa lei, em 2003 um empresário, sem a aprovação da Prefeitura, iniciou a construção de um prédio escolar de grande porte, em uma gleba existente nos fundos das residências da rua Argeu Fuliotto, exatamente em cima da faixa protegida pela lei. Uma quadra de esportes, um enorme reservatório de água e um prédio estão simplesmente colados nos fundos das casas. A Procuradoria do Município embargou a obra e foi desrespeitada, o que levou a Secretaria dos Negócios Jurídicos a obter o embargo judicial por meio de um processo que tramita na 5ª Vara Cível e que também foi desrespeitado pelo empresário. Essa obra, edificada ao arrepio da lei e da Justiça, está praticamente pronta, e o projeto de lei que a Prefeitura enviou ao Comur simplesmente a legaliza. Não parece encomenda?”, pergunta Alves.