Lei de Maggioni beneficia dez loteamentos em RP
Evandro Spinelli
Pelo menos dez loteamentos que estão com suas situações jurídicas pendentes na Prefeitura de Ribeirão Preto poderão obter liberação definitiva com base em lei de autoria do prefeito Gilberto Maggioni (PT).
A lei permite o fechamento –com muros e guaritas– de loteamentos inteiros, transformando em condomínios fechados locais que, em tese, teriam de ser abertos ao público.
Serão diretamente beneficiados o loteamento Royal Park, na zona sul de Ribeirão, e o conjunto habitacional Jardim das Pedras, no Jardim Paulista.
A situação dos dois empreendimentos é irregular porque eles estão cercados por muros e, para ter acesso às ruas que os cortam é preciso passar por uma guarita e obter autorização. Por lei, essa situação só é permitida quando o empreendimento é aprovado como sendo um condomínio fechado. Mas nesses casos, as regras a serem cumpridas são bem mais complexas.
Nos dois casos –Royal Park e Jardim das Pedras– o asfalto das ruas, a iluminação pública e as redes de água e esgoto foram feitas pela prefeitura, diferentemente do que acontece com os condomínios fechados, quando essas obras, desde a aprovação, ficam por conta da empresa responsável pelas obras.
Mas não são apenas esses que serão beneficiados. Foram citados nominalmente pelas pessoas ouvidas os casos do Recreio Internacional, Jardim Itanhangá, Jardim Recreio, Jardim Canadá, Quinta da Boa Vista, Quinta da Alvorada, Colina Verde e Sociedade Hípica. Esses empreendimentos têm situações jurídicas diferentes, mas todos podem se beneficiar com a lei de Maggioni.
A lei foi sancionada no dia 10 de novembro e publicada no “Diário Oficial do Município” do dia 16. Diferentemente do que se informou quando de sua aprovação, não serão apenas as ruas sem saída que poderão ser fechadas, mas loteamentos inteiros, com a condição de que não podem dar acesso a outras áreas. É o caso do Royal Park, que faz divisa com fazendas.
Dois dos loteamentos que podem foram alvos, nos últimos anos, de polêmicas que envolveram a prefeitura e o Ministério Público. O Royal Park, que fechou suas divisas com muros e guaritas, foi acionado judicialmente pelo promotor Antônio Alberto Machado, que considera a medida ilegal e pede a derrubada dos muros.
O Jardim Canadá tem um muro apenas na divisa do loteamento com o Anel Viário Contorno Sul, mas o objetivo dos moradores era cercar totalmente o empreendimento e colocar uma guarita para restringir o acesso de pessoas estranhas ao local.
Pelas normas estabelecidas na lei de Maggioni, os dois poderão obter autorização para fechar suas divisas, pois não dão acesso a outros bairros ou ruas. Criarão, na prática, um condomínio fechado em área pública.
O presidente da Associação dos Moradores da Ribeirânia, Ivens Telles Alves, apresentou, nesta semana, uma representação ao promotor Machado pedindo que ele tome providências para que a lei seja considerada inconstitucional.
Curioso é que o vereador Beto Cangussú (PT) também assinou a representação. Cangussú foi um dos quatro vereadores que votaram contra a aprovação do projeto de lei apresentado pelo prefeito.
Alves disse que a Ribeirânia também é um bairro que pode ser atingido pela lei de Maggioni, já que a maioria das ruas não possuem saída.
O secretário municipal do Planejamento e Gestão Ambiental, João Theodoro Feres Sobrinho, disse que a prefeitura ainda não recebeu nenhum pedido de autorização dos loteamentos fechados e que não está orientando ninguém a fazê-lo, já que a lei ainda não foi regulamentada.
Antônio Emidio Sorrentino, presidente da Associação Amigos do Royal Park, afirmou que o bairro já havia pedido o enquadramento na prefeitura como “bolsão residencial de acesso restrito”, uma personalidade jurídica criada em 1996 e que foi revogada com a lei de Maggioni. Ele disse que o bairro luta há vários anos para regularizar o fechamento dos acessos por questões de segurança.
Secretário diz que lei precisa ser regulamentada
O secretário municipal do Planejamento e Gestão Ambiental, João Theodoro Feres Sobrinho, disse que a autorização para o fechamento dos loteamentos, com base na lei de autoria do prefeito Gilberto Maggioni, ainda depende de regulamentação.
De acordo com ele, mesmo que sejam feitos pedidos baseados na lei, esses pedidos não serão analisados até que saia a regulamentação, o que depende de um decreto de Maggioni. “Mesmo que o processo administrativo seja aberto, vai ter de esperar”, disse Feres.
Ele afirmou ainda que todos os pedidos precisarão ser analisados tecnicamente antes de serem aprovados.
“Depende de uma análise mais apurada do Poder Público se a via em questão pode ser fechada, se esse fechamento vai provocar interferências na condição da estrutura urbana. Precisa ser analisado se vai por exemplo atrapalhar um vizinho que, por causa desse fechamento, vai ter de andar mais três quilômetros para chegar na sua casa. Se for assim eu não posso autorizar”, declarou.
O secretário, no entanto, confirmou que loteamentos em situação irregular, como o Royal Park e o Jardim das Pedras, poderão, em tese, se beneficiar com a nova lei.
“O Royal Park é um loteamento regularmente constituído que foi fechado irregularmente. O Jardim das Pedras foi aprovado como conjunto residencial e que fechou as vias de circulação”, explicou Feres.
Ele disse que nenhum pedido ainda foi feito para a regularização de loteamentos.
“Ninguém quer viver em jaulas”
“A gente não quer elitizar nada. Se você me disser que a partir de amanhã estará garantida a segurança para todo mundo a gente chama um trator e derruba os muros. Ninguém quer viver em jaulas.”
A afirmação é do médico Antônio Emidio Sorrentino, presidente da Associação Amigos do Royal Park e defensor da lei que permite o fechamento dos loteamentos.
Ele diz que o bairro é estritamente residencial e que não dá acesso a nenhum outro local porque faz limite com fazendas. Com isso, poderá se enquadrar na nova lei proposta por Maggioni, mas ele disse que teve acesso às informações da lei apenas por intermédio da imprensa.
O presidente confirmou, no entanto, que a associação dos moradores já está providenciando o abaixo assinado e a documentação necessária para pedir a regularização do fechamento do bairro. Sorrentino refutou a tese de que a lei vai criar locais de elite na cidade e disse que os moradores do bairro são penalizados. “Nós somos duplamente penalizados em termos econômicos. Nós pagamos os nossos impostos e ainda pagamos uma contribuição associativa para ter a segurança no nosso local de moradia.”
O presidente da associação disse que o bairro foi criado por volta de 1980 e que ficou muito tempo praticamente esquecido. As primeiras construções do bairro sofriam com a violência. Ele diz que o auge foi em 2000, quando os bandidos chegavam a fazer famílias inteiras de reféns dentro de suas próprias casas e depois fugiam com os carros das vítimas.
A decisão de cercar o bairro e colocar guarita teria sido tomada aí, baseada em uma lei municipal de 1996 que instituiu o bolsão residencial de acesso restrito, também considerado inconstitucional pelo Ministério Público.
“A gente está privilegiando o bem maior, que é a vida. Enquanto o Estado não dá os serviços, a educação, a saúde, a segurança, se uma comunidade se organiza, deixa”, defendeu o presidente da associação.
Para Sorrentino, é demagogia dizer que a lei só vai beneficiar os ricos. “Isso se fala porque dá audiência, mas não é assim. Todo mundo pode comprar um carro importado. Não está escrito na lei, mas é assim que funciona. Mas só compra quem tem condições no momento. Isso é da sociedade.”
Moram no Royal Park cerca de 180 famílias, mas o bairro possui 600 lotes. A maioria está desocupado.
Lei é inconstitucional, dizem opositores
A lei que permite o fechamento de ruas e loteamentos é inconstitucional, na avaliação de moradores que se opõem à idéia.
Ivens Telles Alves, presidente da Associação dos Moradores da Ribeirânia, fez uma representação ao promotor Antônio Alberto Machado pedindo providências. Para ele, a lei fere o direito de ir e vir dos cidadãos, que está previsto na Constituição Federal.
Alves avalia ainda que os moradores vão sentir uma falsa sensação de segurança com o fechamento das ruas.
“Há muitos terrenos vazios e não vai adiantar colocar uma cancela na rua porque o pessoal pode entrar por esses terrenos”, disse o presidente da associação.
Ele afirmou ainda que a lei pode criar “guetos” nas ruas que forem fechadas com base na lei de Maggioni.
“No primeiro momento, o morador vai achar bom porque vai ter segurança.
Só que ele vai ter de assumir os custos da coleta de lixo, da manutenção das ruas, da iluminação pública.
No primeiro mês ele paga, no segundo mês ele paga, no terceiro mês ele não paga mais e aquilo vai virar um gueto sujo. E o cara que paga vai se sentir dono da rua e vai querer colocar sua cadeira na calçada, no meio da rua. Vai criar muitos problemas com os vizinhos”, disse.
O publicitário Edmo Bernardes, morador do Royal Park, também se declarou contrário ao projeto que, segundo ele, cria cidadãos de primeira e de segunda classe na cidade.
“É uma questão social. Estão querendo fechar pra quê? Para que os ricos não tenham