Rio - Foi preciso muita insistência para que Jane Di Castro assumisse a função de síndica do Edifício Kansas, em Copacabana. Era preciso conciliar a tarefa com os shows mundo afora e os afazeres de seu salão de beleza, na sobreloja do prédio onde mora há 15 anos. Além disso, ela sabia que teria que enfrentar o preconceito de alguns. Jane, de 63 anos, é atriz, cantora, cabeleireira e, para surpresa de alguns vizinhos desavisados, travesti. Hoje, está no quarto mandato como administradora do prédio e diz, orgulhosa, que conquistou uma vitória, como mostra a reportagem de Flávia Monteiro para o Morar Bem deste domingo. “Nunca ninguém tinha visto um travesti assumir um condomínio. Nos anos 70, eu era proibida de entrar maquiada dentro do meu próprio edifício. É uma conquista e tanto”, diz.
Aceito o desafio, Jane lançou mão de sua experiência na montagem de shows e começou a sua gestão dando um banho de loja no edifício, que tem 12 andares e 78 apartamentos. “O prédio estava caindo aos pedaços. Não fazia jus à sua localização, em frente ao Copacabana Palace. Comecei por uma grande maquiagem, porque visual é tudo. A portaria foi pintada de marfim, minha cor predileta, e ganhou quadros, sofá e arranjos de flores. Proibi a circulação de cachorros sem focinheira e acabei com o oba-oba de gringos que insistiam em trazer garotas de programa para os apartamentos alugados por temporada. Coloquei ordem no caos”, conta.
GESTÃO BASEADA EM LIVRO DE AUTO-AJUDA - Dos funcionários, Jane exige uniforme impecável e uma postura exemplar diante dos moradores. Quando precisa, ela mesmo bate ponto na portaria. Só não se mete quando o assunto é briga de vizinho. E, quando é preciso, desce do salto: “Exijo respeito. Quando as pessoas me tratam com educação, sou a Jane Di Castro. Mas para aqueles que apelam para a ignorância, entre em cena o Luiz de Castro. Nessas horas, meu lado masculino aflora”, brinca.
Assim como Jane, há muitos síndicos por aí que fogem dos padrões e não relutam em recorrer a métodos pouco convencionars de administração de condomínios. E que, mesmo considerados excêntrciso, acabam conquistando o reconhecimento dos moradores.
É o caso do síndico Moysés Alves, de 59 anos. Nos quadros de avisos pelo edfício que administra - o Barão de Pinhal, em Piedade, com 128 apartamentos - provérbios misturam-se às dicas de como manter o condomínio limpo.
Dentro do elevador, pregado à parede, está um papel com os sete segredos para o gerenciamento do estresse, segundo o autor americano Rick Warren: identificação, dedicação, organização, concentração, delegação, meditação e ralaxamento.
Cada um deles exerce influência direta na gestão do síndico, que é músico. Mas o que dita mesmo a sua administração é o livro “Uma vida com próposito”, do mesmo autor. “Eu recomendo a leitura do livro a todos os moradores. Brinco com eles dizendo que, após a leitura, que deve ser feita em 40 dias [um capítulo por dia], quem não gostar recebe o dinheiro de volta. Em todos os avisos do prédio, há citações de trechos do livro. Hoje, quando assino um comunicado com ‘a administração’, os moradores reclamam. Eles se acostumaram com uma assinatura que inventei: ‘Moysescompropósitos’”, conta.
Bem-humarado, Moysés garante que o livro exerce uma influência positiva sobre as pessoas. Foi depois de receber uma carta com trechos do livro, conta, que o então prefeito Cesar Maia cedeu a ses apelos oara que a rua ganhasse uma galeria de águas pluviais.